segunda-feira, 13 de junho de 2016

Nova prosa com Ariano

Sobre o que sucede por estas bandas...

Fonte da imagem:[www.almanaquedacultura.com.br]

_Mestre Ariano... vamos confabular um bocadinho?

_Diga lá, essa menina! O que sucede desta vez? Qual foi a agonia que se aboletou no seu coração?

_Mestre... Eu ando encafifada com os acontecimentos pelas bandas de cá deste mundo. O senhor vive noutro plano, faz nem ideia do que ocorre por aqui. Mas se cá estivesse, será que a balbúrdia acontecida nestas paragens daria um Auto dos bons, daquele da Compadecida? Que lição a gente pode tirar de tudo isso?

_Oxente, homem, me conte a ruma de coisa que tanto se passa por aí, que eu digo daqui o que faria! A cadeira celestial aqui é boa, de uma palha até confortável, mas nunca mais escrevi uma linha sequer. De repente, eu dito e você escreve daí!

_Espie só, mestre: o respeito é uma coisa rara, o senhor bem sabe. Isto acontece por aqui desde o seu tempo. Mas está cada vez pior. O povo não quer saber de entender o gosto do outro, as suas posições políticas, as suas crenças, como se posiciona sexualmente na sociedade. Foi diferente da pessoa, vixe! Mete logo o pau! E não fica por aí, não, professor! O povo julga, condena, esquarteja e mata. O sujeito não tem nem direito a um julgamento justo. Pode isto?

_Olhe, essa menina, estava aqui pensando na cena do julgamento da minha obra, que você conhece muito bem, e penso que o diabo não ia conseguir salvar ninguém dessa vez, pelo que você me conta. Acho até que ele ia precisar dos ‘décimos’ do inferno, porque os quintos já estariam todos ocupados, não é, não?

_Então, não é, mestre? A coisa está indo de mal a pior. É rico humilhando pobre, achando que por ter muitos tostões na carteira vale mais que a vida dos desvalidos. E nas empresas, então! É igualzinho àquele seu ditado: ‘é tanta condição que se exige pra dar emprego, que eu não conheço um patrão com condição de ser empregado’. E é até pior, porque os patrões impõem o seu poder sobre os que precisam, e o assédio moral é a coisa mais comum. Daqui a pouco vai fazer parte dos valores estabelecidos nas organizações, vai ser a missão: ‘Humilhar os hierarquicamente inferiores, diariamente, para que façam apenas o que mandamos, sob pena de exclusão do quadro de funcionários’. E ainda tem aqueles bajuladores de plantão, que não perdem a oportunidade de fazer mal ao colega. O senhor não vai nem acreditar, mestre. Enquanto isto... os ricos cada vez mais ricos... As águas seguem correndo para o mar. Eu mesma não me admiro mais de nada!

_Repare bem, essa menina... pelo que você me conta, o enredo é o mesmo daquele Auto, está tudo lá – simonia, estelionato, incitação à concupiscência, velhacaria, arrogância com os pequenos, subserviência com os grandes, em prol dos escusos interesses comuns, ausência total de coleguismo, intolerância religiosa, de gênero, profanação do nome de Deus... E tudo isto capitaneado por uma ruma de falsos pastores, de homens cheios dos tais ‘fóbicos’, de patrões que não conhecem a verdadeira liderança, um bando de cachorros (sem querer ofender os bichinhos), premeditadores (e réus) de crimes inúmeros, travestidos de paladinos da moral e da ética. Falta nada mais, não. O que você acha, essa menina? Está mesmo uma desgraça só! E estou vendo que está tudo num bolo só, espalhado por tudo o que é canto, de todo tipo e qualidade de instituição. Está na instância política, está nas empresas, nas igrejas, na sociedade toda... Aliás, essa menina, eu tenho pra mim que deveriam inventar outro nome pra sociedade. Se sociedade quer dizer um agrupamento de gente que convive em colaboração mútua, esse negócio está errado, não está, não?

_Mestre... está difícil, mesmo. Eu penso, penso, me viro pra ver se sai uma reflexão... mas, neste caso, o penso fica torto e eu não encontro uma saída. E se a gente apelasse para o Capitão Severino, pra ele mandar uma carrada de bala nessa (des)gente toda?

_Adiantava, não, essa menina. Você iria se igualar a todo esse rebanho de condenados. Iria ser mesminha àquele povo que tira a vida do seu semelhante, alegando a ordem de Deus, em nome de uma religião que nada disto prega. Seria igual aos patrões que pensam ser reis, arrodeados de súditos. É tudo uma cambada de desordeiros, fingidores de moralidade. Deixe este povo pra lá, quem nem pra dar gosto ao Cão eles servem. O causo é de pedir inspiração divina e aumentar a fé, e seguir firme nas suas convicções de amor e respeito ao seu semelhante. Porque nem pra rir serve... Nem mesmo as inocentes e engraçadas artimanhas do meu João Grilo podem nos arrancar o riso frouxo. Talvez, só mesmo as lorotas de Chicó podem nos servir como engodo pra gente ganhar tempo enquanto pensa numa saída mais justa para todos. E muita reza, essa menina... muita apelação à Compadecia... para que ela volva seu manto sobre os inocentes, sobre os que perdem a vida, sobre os que sofrem injúrias, perseguições, ameaças... sobre os que choram a morte dos seus, sobre os que sofrem violências, sobre os padecem com a miséria...

_ É, mestre, Ariano... Eu volto a refletir que a arte tenta imitar a vida, mas a história que estamos vivendo tem enredos e personagens tão extraordinária e cruelmente reais, que não há ficção capaz de atribuir mera coincidência em qualquer que seja a semelhança...

_É, essa menina, se amofine, não! Tenha fé em Deus, Jesus e na Compadecida, que vai dar tudo certo. Eu não sei como... só sei que será assim...

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